"Minha mente está cheia e eu estou transbordando" [Ira!]
"Acho que mais me imagino do que sou, ou o que sou não cabe no que consigo ser." [Ferreira Gullar]
"Quem fala em flor não diz tudo. Quem fala em dor diz demais. O poeta se torna mudo sem as palavras reais." [Ferreira Gullar]


- Não importa se é sem sentido, não importa se é sem significado. O importante é que escrevo e assim alivio. Seja bem-vindo ao meu mundo e voe por meus versos! Dê os devidos créditos e assim terá um mundo inteiro de palavras onde viver. Esse é meu mundo e se quiser fazer parte dele é só me seguir...

11 de agosto de 2012

A menina e suas borboletas


Imagem: Google imagens

Espera. Era aquela sensação mesmo? Será que ainda havia alguma primavera ali dentro que lhe pudesse dar as borboletas no estômago? Há tanto tempo não se sentia assim, desacostumara-se com a sensação gostosa de um beijo quente, um afago suave e um abraço apertado com gosto de saudade. Não se lembrava mais a diferença entre um suspiro de sonho e o de cansaço. Eram ambos relativos e quer saber? Era o mesmo movimento com os ombros, só que era lá dentro dela que mudava tudo. Já não conseguia apreciar as tardes de sorvete porque não tinha tempo, não havia com quem partilhar um sorriso melado e um céu cheio de estrelas. Para ela essas coisas tinham tanta importância, e agora se dava conta de que não se lembrava do dia em que tudo perdeu a cor, quando foi que passou a ignorar a lua, tua companheira até então. Não lembrava mais quando foi que o pôr-do-sol não lhe era mais um espetáculo divino de se ver sentado na grama de mãos dadas com o coração do outro. Não lembrava sequer, da última vez em que amara a si própria, a deslumbrar a imagem refletida no espelho. E se culpava por todas as belas tardes nubladas que perdera enfiada num moletom sem graça assistindo o futebol que tanto odiava. Culpava-se por todo o chocolate em excesso que comera porque eles estavam em crise e por todas as palavras ridículas de raiva e depois arrependimento que se seguiam, e das crises de choro. Espera. Não era isso que estava a sentir naquele momento. Não era culpa, arrependimento, tristeza, nostalgia. Era algo que já conhecia, só não lembrava. Era uma sensação gostosa, sabe? Daquelas em que sentar para ler um livro sob uma árvore significa paz. Ela agora, parecia poder escutar o som de seu coração, “tum-tum, tum-tum”. Quando foi que deixou de prestar atenção nisso? Será que foi quando achou que amar seria doar-se por inteira? Fazer o outro feliz desde que isso custasse sua própria felicidade? Talvez fosse, porque agora conseguia ouvir as batidas do próprio coração, conseguir imaginar as borboletas voando livres e não presas no estômago, embora o bater de asas tenha deixado uma leveza e certo remelexo ali dentro. Agora sorria bobamente com uma frase precipitada, mas se entristecia com o passado lhe atormentando. Não é tormento a palavra certa, mas sim, tentativas vãs de mudá-la e retirar aquilo que estava sentindo naquele momento. Era tão bom se sentir viva novamente, como se todo esse tempo estivesse inerte, adormecida para o que era, adormecida para ela mesma. Então era isso, agora se sentia desperta novamente. Hibernara dentro de sua casca mais uma vez, mas era primavera e estava disposta a explorar as partes que decidiu ocultar um tempo, é que agora podia sentar horas e horas vendo o pôr-do-sol e o nascer da lua sem que ninguém lhe apressasse por ter final de campeonato. Podia contar as estrelas, perder as contas e recomeçar quantas vezes quisesse, porque gostava mesmo disso. Encontrara a parte que se perdera no relacionamento passado, não era saudável aquilo e por isso chegara ao fim. Aprendera tanto, mas também se perdera um pouco e agora estava a se recuperar de tudo que se passou. Nossa! Parecia que há muito tempo não se olhava no espelho de verdade, olhando direto nos olhos parecendo enxergar a alma e conversar com si mesma. Espera. Era da sensação das borboletas de que falava, pois bem, era bom sentir aquilo novamente. Sonhar, o que sempre fizera, agora não parecia tão bobo. Até os medos se tornaram outra coisa, agora se perdiam na infinidade de palavras ditas para o espelho e todas as que ficaram em papeis rasgados e velhos, que ela sabia que nunca leria novamente. Mas tinha a certeza de que se lembraria das palavras, letra por letra como se fosse uma música a ecoar dentro de si. E quer saber? Borboletas são mais bonitas livres e não aprisionadas no corpo. Não precisava mantê-las naquele regato ácido de sentimentos perdidos e confusão. Libertara-as, mas sabia que voltaria a sentir o bater de asas e a sensação de leveza, porque agora, as borboletas estavam a fazê-la voar também.


Laura Ribeiro